14.7.10

14 ;

''já era tarde quando alguém acendeu a luz do quarto, pegou num dos livros da estante e acomudou-se no sofá ao lado do abajur. a vista cansada confundiam as letras do capitulo que, ao que parecia, falava sobre amor. quando já não entendia o sentido do que estava escrito foi atrás dos óculos. ao colocá-lo leu pausadamente:           


“como se fosse possível não sentir um certo rancor. como se fosse possível ausentar o ódio que secava a garganta. tu ages como se fosse possível dissipar o sentimento cortante e colocar no rosto um sorriso oco. mas na verdade não é possível. não é possível fechar os olhos e ao abri-los contemplar novamente o principio. não é possível ignorar com uma respiração profunda ultrapassar o limite do desequilíbrio óbvio, desequilíbrio causado ao coração.não é possível abrir mão do evidente e forçar uma satisfação fria.
tu tão decidida e eu distraído
tu tão dedicada e eu contido.
tu tão interessante e eu comum.
tu tão surpreendente e eu previsível.
tu tão sonhadora e eu silêncioso.
tu tão púrpura e eu cinzento.
tu tão simples e eu geométrico.
tu tão sincera e eu ausente.
tu tão reluzente e eu sombra.”


tentou virar a página, mas a folha soltou-se do livro, permanecendo entre os dedos. verificou o verso. reconheceu nos rascunhos manuscritos os traços inclinados do seu irmão mais novo. aproximou a folha do rosto e numa observação mais atenciosa percebeu que o que estava escrito não pertencia a livro algum. As iniciais T.S. no final da página confirmavam que foi o irmão quem digitara e imprimira aquelas palavras há pouco tempo, visto o bom estado e brancura do papel.
colocou o papel novamente entre as páginas do livro, riu consigo mesmo. o seu irmão já estava confuso com as artimanhas do coração.


o livro voltou para a estante e a luz foi apagada. ''

Sem comentários: